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Reflexões sobre conceituação em Ciências Sociais

Por Pedro Vanzo


A rotulação de determinados padrões, sejam sentimentais ou comportamentais, a fim de tornar claro determinado posicionamento dos indivíduos com relação a algum assunto é rotineira na história. A ideia é, dentre muitas, separar pessoas entre contra ou a favor de determinada opinião. Assim, conceitos são criados para dar mais consistência ao que chamo aqui de ‘’caixas isoladas’’, que tendem a dividir a sociedade.

Se observarmos a história e, principalmente, a maneira como ela é contada, é possível notar que há diferenças entre o que ocorreu e o que foi relatado sobre aquilo – o que depende diretamente da perspectiva e olhar pessoal de um indivíduo. Por isso, cria-se uma linha tênue entre realidade e ponto de vista, podendo existir lacunas que deixam certas análises prejudicadas e, assim, nem sempre utilizáveis quando pretende-se compreender um determinado momento. Especificamente nas Ciências Sociais, alguns fenômenos geralmente se apresentam sob conceitos específicos, ou seja, sob uma determinada ótica. Por exemplo, ao ler sobre algum aspecto da vida de Lula, ex-presidente do Brasil, inevitavelmente esbarra-se em conceitos como ‘’esquerda’’, ‘’comunista’’, ‘’petralha’’, etc.

Pode-se observar que, além de toda a utilidade analítica que um conceito carrega em si, existem diversos perigos que eventualmente distorcem aquilo que se tem como ‘’realidade’’. José Murilo de Carvalho, cientista político brasileiro, já elaborou uma discussão sobre os cuidados que devem ser tomados ao aplicar conceitos a situações que divergem do tal conceito aplicado e, por isso, ferem diretamente tal conceito – além de distorcer gravemente o que se passa no fenômeno estudado.

Renato Perissinotto, professor de Ciências Sociais na Universidade Federal do Paraná, também evidenciou o perigo existente nos estudiosos que se utilizam, por exemplo, do método do institucionalismo de escolha racional como um meio de explicar determinado fenômeno social. Já que, ao utilizar esse método, procura-se respostas em processos decisórios dos fenômenos sociais e, por isso, acabam não levando em consideração aquilo que antecede esses momentos, que, em muitos casos, são determinantes.

Com isso, o professor defende a aplicação da Sociologia Política como método de estudo – um caminho possível e eficaz. Isso porquê o pesquisador que se utiliza dessa linha de raciocínio, tem a possibilidade de encontrar uma melhor compreensão de determinados fenômenos, justamente porque esse sujeito busca, além de qualquer processo decisório, todas as possíveis construções que levaram a tal resultado.

No que diz respeito ao momento atual do sistema político brasileiro, vive-se uma intensa polarização. As caixas isoladas separam aqueles que são ditos de ‘’direita’’ e os que são de ‘’esquerda’’ – aqueles que são contra ou a favor do atual governo, por exemplo. ‘’Conservadores’’, ‘’liberais’’, ‘’comunistas’’, ‘’coxinhas’’ e outros termos são utilizados para marcar essa cisão.

Olhando especificamente para esse exemplo, é fácil encontrar uma problemática entre o conceito e suas aplicações. A rotulação indevida e a criação de ‘’caixas isoladas’’ influi diretamente em uma partição que polariza grupos sociais, instituições, etc. O efeito dessa polarização é sentido na grande mídia, na opinião pública e nas guinadas diversas que tomaram conta da vida política do Brasil no decorrer dos últimos anos.

Passemos a olhar o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff: criam-se rótulos a partir de conceitos erroneamente aplicados, polarizando a opinião pública e causando esse desconforto político vivido até os dias atuais. A ascensão do vice-presidente Michel Temer, o bombardeamento com relação a escândalos envolvendo parlamentares já partiram da existência dessa binarização de opiniões.

Atualmente, por conta de toda essa lógica, conceitos passaram a ser fatalmente ligados a determinadas opiniões, sem que exista antes um questionamento sobre a lógica desse encadeamento. Por exemplo, ao elogiar o Partido dos Trabalhadores (PT) publicamente, muito provavelmente recebe-se o rótulo de ‘’comunista’’, ‘’petralha’’, entre outros, ainda que o emprego de todos esses termos esteja incorreto.

É importante postular que não é possível banalizar a teoria, bem como se faz muito necessária manter-se atento a realidade prática para compreensão total daquilo que se pretende estudar. Com isso, criam-se possibilidades analíticas para aqueles que, por exemplo, desejem estudar a política no Brasil, sem que caiam em determinadas ‘’caixas isoladas’’ como seu único suporte analítico. A colocação de um indivíduo dentro de categorias conceituais não implica que se compreenda na totalidade os comportamentos observáveis.

Quando se adentra em determinadas realidades tendo o cuidado da aplicação conceitual, tem-se uma enorme possibilidade de, ao final, se compreender o que se passa em determinados fenômenos sociais e quais são seus impactos. Pode-se, ao menos, chegar a alguma compreensão desses fenômenos, sem possuir a ambição que seja o resultado final dessa pesquisa, mas sim um início promissor.

Sempre um mesmo olhar de uma mesma maneira, não acompanha com a devida rapidez as modificações dos fenômenos sociais. Em uma piscar de olhos, fenômenos se alteram, se criam e se extinguem.


Referências

CARVALHO, José Murilo de. Mandonismo, coronelismo, clientelismo: uma discussão conceitual. Dados, vol. 40, n. 2, p. 229 a 250, 1997.

PERISSINOTTO, Renato M. 2004. Política e Sociedade: por uma volta à Sociologia Política. Política e Sociedade, nº 5, Outubro.

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